SOLDADINHO NOVO
(romance tradicional)

"Adeus soldadinho novo que tão triste andas na guerra.
Ou te lembra pai ou mãe ou alguém da tua terra."
"Não me lembra pai nem mãe, nem ninguém da minha terra,
Só me lembra a minha amada, que era uma linda donzela."
"Toma lá este cavalo, vai a tua amada ver,
Mas no fim de sete meses há-des mo cá vir trazer."
Soldadinho, de contente, no cavalo s' amontou.
Chegando lá muito adiente, o Diabo o incuntrou.
"Não te espantes cavalo branco, cavaleiro que nele vem."
(Não é assim.)
"Não te espantes cavalo branco, cavaleiro que nele vem,
Aqui tens a tua amada, que t' amou com grande bem."
(Enganei-me.)
"Onde vás ó soldadinho, por que vás todo a termer?"
"Deixa-me lá ó diabo, vou a minha amada ver."
"Tua amada já é morta. Já é morta, bem na vi."
"Dá-me os sinais que levava, que me quero fiar em ti."
"Levava vestido d' ouro, camisa de carmesim.
Os padres qu' àcompanhavam não tinham conto nem fim.
Forem a abrir a cova cá no centro do jardim,
A enxada era de prata, o cabo de marafim."
"Mas seja o que Deus quiser, eu p'ra diente sempre vou."
A meio da sua jornada, um nuvraceiro s' armou.
"Não t' espantes cavalo branco, cavalheiro que nele vem.
Aqui tens a tua amada que t' amou com grande bem."
"Se tu és a minha amada, porque não olhas p'ra mim?"
"Os olhos com qu' eu te via já de terra os enchi."
"Se és a minha amada, beija-me agora aqui."
"Os lábios com qu' eu te beijava, já a cor deles perdi.
Vai-t' imbora, vai-t' imbora, vai-t' imbora amor eterno.
Já sinto por mim puxar lá das cordas do Inferno."
"Eu hei-d' ir àquele outêro, eu àquele outêro hei-d' ir.
Tanta vez t' hê-de bradar, até que m' há-des acudir."

(Aprendi, mas não era assim. E aqui está. Mas isto não aconteceu. O capitão não dava o cavalo ao soldado.)

Esta versão do romance medieval foi recolhida por mim no concelho de Marvão, na aldeia do Carvalhal (freguesia de São Salvador da Aramenha). Foi recitada por Maria Josefa Baptista (1919-2003). Reproduzimos neste post a recitação tal qual nos foi transmitida, incluindo todas as hesitações e intervenções da informante. - Ruy Ventura

2 comentários:

Anónimo disse...

Pois é, Ruy, tenho andado a vasculhar os teus escritos. Estes e não só. Parece haver tema de conversa para aquelas horas que vamos passar a estar na escola...

Ruy Ventura disse...

Claro...