Mário Chamie

Fogo no Céu da Boca

Os que possuem a palavra e o relho
se consultam sem assédio
sem assalto no invadido terreno
do seu reino.
Cortam a fibra do meu tédio.

O assalto é coisa certa de direito
de quem tem o relho e o mando
de meu peito.

O assédio é coisa rápida de comando
de quem tem a estaca e a cerca
de meu campo.

Não são lúbricos os que possuem
o código de meu tédio
que, mais que meu, é público.

São súditos de seu juízo
se me julgam
em seu inquérito.

Eu os compreendo com o desprezo
que os enerva
quando piso no terreno do meu reino
e renego a paz que me renega.

Mas não espero o reverso da medalha.
Em vez da paz é a guerra
o que me dão esses morcegos
fortificados em sua muralha.

Eu os desprezo com o descrédito
que os assalta no assédio
com que atacam a retaguarda
de meu tédio sem ressalva.

Ganham a batalha, pois tudo têm
para o triunfo de seu reino:
a palavra e o relho, o código
e o súdito sem remédio
entre a estaca e a cerca
de seu terreno.

Mas não me rendo, nesse entrevero.
Do fundo de minha derrota
vejo o pânico dos que não lambem
o barro de vossa bota
na poça de nosso sangue.

(in A Quinta Parede, Rio de Janeiro, 1986)

1 comentário:

Anónimo disse...

Eu acho que os poetas do que V. tem chamado neo-naturalismo deviam pôr aqui os olhos e que talvez melhorassem o que fazem e é chato e indigesto com a desculpa de estarem a descrever a realidade do povo, a ajudar as massas. lol :)

Romana