ALGUNS POEMAS
DE RUI ALMEIDA
O brilho da névoa
Uma febre luminosa arrastada adiante
Todos os pés de quem passa sem ruído
Sempre longe o mínimo tremor
E o vento, uma toalha solta agitada
Há os que dizem coisas por não as saberem
E os que olham passam suspensos
Os dias são sinais, são tardes inteiras
Corrosão que pode ser dita
Actualizada a cada momento
Tentativas sem sucesso para avançar
A destreza dos barcos nos dias de chuva
Ou a lentidão observada à distância.
*
1.
A nitidez da folha rasgada
Da falha corroída no centro
Sugere o movimento de quem caminha
De quem não sabe aonde ir
Mas que não espera, mas que não se esconde
2.
Quando se projecta no vidro a sombra
De um ser que voa e voando surge
Nunca pássaro, nunca anjo, sempre sombra
Que se ausenta sendo visível e certo
Então de luz o olho de repente arde
3.
Da deslocação para a margem se envolve
A presença da minúcia, o reflexo
Raro a sedução pela distância ou
Qualquer tentativa de aumentar a queda
Porém de novo se alimenta o sopro da pobreza
Saídos do seu primeiro livro, Lábio Cortado (uma estreia que não envergonharia ninguém – tanto mais que recebeu o Prémio Manuel Alegre – 2008, instituído pela Câmara Municipal de Águeda), estes poemas de Rui Almeida são, quanto a mim, os pontos mais luminosos da colectânea. Não dispensam contudo a visitação da obra inteira – editada pela Livro do Dia Editores, sediada em Torres Vedras –, a qual conta com o posfácio de Paulo Sucena, um dos membros do júri que decidiu galardoá-la.
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