José do Carmo Francisco
Os labirintos do esquecimento
(para uma leitura de De sombras y sombreros olvidados)
Os poemas deste livro de Marta López Vilar que recebeu o Prémio Blas de Otero de Poesia oscilam a sua respiração poética entre a Arte e a Natureza.
Alguns poemas denunciam no seu articulado um convívio permanente com a literatura. Por exemplo: «Como siempre, se acostumbra la luz / hasta muy tarde. / También yo, que espero tu voz / com el dolor cumplido / y un poema de Montale / Nel fumo / a punto de decirme donde estás.»
Entre a vida chamada «real» e a vida povoada por símbolos, imagens e metáforas, o poema testemunha uma expectativa: «Hace tiempo que abandonamos / la pátria de los símbolos / Ni noches ni poemas. / Sólo el olvido / y la certeza de que no estarás / al otro lado de la cama.»
Depois do encontro vem o esquecimento em «El después»: «Entre tu y yo la vida se ha perdido.»
O segundo capítulo instala os poemas na Natureza. Vejamos «Los motivos de la aurora»: «Como si hubiera tenido tu cuerpo / acorralado entre la espuma / deambula la luz. / Puedo escribir sus pasos / sus cuchillos, hogueras, caracolas…»
Mas instala não só os poemas mas também os protagonistas como em «Víctimas de la aurora»: «?Qué esperamos tú y yo / en esta esquina helada de la aurora? / Todos los encuentros ya llegaran / Ahora, palomas muertas y las palabras / contemplando todos nuestros cuerpos.» Subtilmente a autora liga as duas realidades (Arte e Natureza) num poema: «Es la aurora quien nos observa com los cien / ojos de Argos, quien recorre / uno a uno tus cuerpos fatigados y dormidos / tu brillo constelado entre la cama / Dentro de ti se despierta un cauce / de olvido y de memoria / del que yo bebería cada amanecer / si no durmieras.» Refiro subtilmente porque a autora conjuga com toda a naturalidade uma realidade geográfica («aurora») com um valor cultural que radica na mitologia grega («Argos») e no seu conhecimento.
De novo a Arte surge num conjunto de poemas a partir de motivos poéticos (Carles Riba, Jorge Luís Borges, Lizardi e Stratos Marino/Georgios Seferis) e a Natureza a partir de memórias de cidades como Granada e Atenas. A primeira porque é uma cidade repleta «de fuentes y de flores»; a segunda porque há cidades necessárias para apagar a obscuridade: «Al igual de los dioses, hay ciudades necesarias / para borrar lo oscuro / la tiniebla poderosa de la palabra rota / o esse no querer despertar outra vez / de la caverna del olvido y de la muerte.»
Um dos problemas que se colocam à escrita (e à leitura) dos poemas de alguém que domina a história e a teoria da literatura, os conceitos e os meios de tradução poéticas de várias línguas, é o perigo real de haver um excesso de cultura, um luxo verbal, uma certa ostentação. Os poemas deste livro desviam-se convictamente desse perigo. Bastam pequenas citações de um poema para se perceber a capacidade da autora para surpreender os leitores com versos inesperados, insólitos e felizes.
Vejamos quatro curtas citações de um poema intitulado «Apuntes sobre tema de Noviembre»:
«Qué lluvia, qué amor de paraguas tan extraño
Cruzo la madrugada com nosotros dentro
Para que nunca nos salvara.»
«Recuerdo que no estabas o que nunca habías llegado.»
«Noviembre. Tú buscabas la muerte como quien explica
la llegada de un tren vacio desde la lejanía del invierno.»
«Morir o vivir / forman parte de la misma mentira. /
Cada dolor tiene su ángel hermoso / custodiando los cuchillos.»
Entre o precário ostensivo do Amor e o inevitável misterioso da Morte, o poema de Marta López Vilar lembra que só se pode olhar para o esquecimento com prudência quando caminhamos nos seus enormes labirintos.
Vejamos o poema «Las sombras y los olvidos»:
«Ni el amor ni la muerte a ti me une / solo la desolación de marcharnos / sin cordura hacia el olvido / yo no regresar nunca y no saber / qué hemos vivido ni com quién.»
(Editora: Ediciones Amargord, Capa: René Magritte, Foto: Luiz Pablo Nuñez, Prefácio: José Cereijo)
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