E AGORA? (2)
O resultado do referendo conduziu à descriminalização do aborto em Portugal. Os resultados, tal como aconteceu em 1998, não servem no entanto para qualquer uma das tendências de voto embandeirarem em arco. Apesar de a abstenção ter diminuído, é preciso ter em conta que 56,9 % dos eleitores resolveram não se pronunciar sobre o tema em questão. (Muitos deles entenderam certamente a “jogada” de José Sócrates que, raposão, soube aproveitar este pretexto para lançar poeira sobre os olhos dos portugueses, desviando a sua atenção dos reais problemas do país e das manobras que vai maquinando...)
Por isto, é cómica, não fosse trágica, a euforia de alguns prosélitos do “sim”. Tentam a todo custo encobrir uma realidade: de um universo de 8.098.480 eleitores, só 3.777.131 votaram e, desses, apenas 2.238.053 aprovaram a descriminalização, isto é, 27,6% dos inscritos nos cadernos eleitorais... Esta atitude agora verificada é, infelizmente, uma réplica da assumida por alguns vencedores de ’98, provando que poucos aprendem algo com as lições do passado...
Com a descriminalização de um acto eticamente reprovável (nisso, sincera ou hipocritamente, todos os portugueses parecem estar de acordo... embora muitos esqueçam que, deste modo, se separou a lei da ética...), de ambos os lados há responsabilidades acrescidas.
Do lado do “sim”, espera-se uma postura consequente, na defesa igualmente acérrima dos direitos de todas as mulheres e respectivas famílias que recusam o aborto e desejam ter filhos. Gostaríamos todos que os eufóricos vitoriosos (que afirmam defender a vida... e eu acredito!) pugnassem agora pela concessão de incentivos à natalidade (num país em envelhecimento acelerado) – nomeadamente o alargamento das licenças de maternidade, tal como na Alemanha –, pelo apoio intenso aos casais em dificuldades económicas e com filhos, pela aprovação de mecanismos facilitadores da adopção de crianças, por um regime de efectiva protecção dos menores em risco, pela publicação de legislação que defenda os pais e mães deste país no emprego (a começar pela Função Pública), por uma eficaz fiscalização dos abusos que eventualmente se cometam nas futuras clínicas abortivas, por uma política de planeamento familiar que promova a responsabilidade, por uma lei do aborto que ainda assim promova a vida (fazendo perceber às mulheres eventualmente desesperadas que o aborto não é solução, mas problema), pela perseguição dos operacionais do aborto (não falo das mulheres!) praticado após as dez semanas.
Do lado do “não” espera-se a continuação e o aprofundamento das iniciativas que visam a ajuda às mães e às famílias em dificuldades, a denúncia persistente do mal ético que constitui o aborto (sem hesitações, mesmo perante insultos soezes), a vigilância activa da aplicação da lei do aborto que venha a sair do Parlamento. Mas, também, uma atitude consequente e verdadeira da parte de alguns líderes com voz ouvida na sociedade no campo social e religioso, nomeadamente defendendo uma educação para a sexualidade responsável, um planeamento familiar que evite o recurso ao aborto e uma acção transparente (não corrupta e/ou caciqueira) de algumas das instituições que tutelam. Espera-se ainda que alguns empresários ditos cristãos concretizem, sem hipocrisias, a fé que dizem professar, nomeadamente accionando nas suas empresas práticas laborais que protejam a maternidade e a paternidade (ao contrário do que actualmente se passa em muitos locais de trabalho).
3 comentários:
Pois é amigo, o mal deste país é que se começa sempre pelo fim.
Essa é que é essa!
Felicito o Ruy Ventura, autor que admiro, pela sua verticalidade e postura de cidadão. Defende os seus pontos de vista com qualidade e ponderação, tem coragem de remar contra os folclóricos que por aí andam. Bem haja!
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