JOSÉ DO CARMO FRANCISCO


Balada para Anabela

Duas vezes Anabela
Colina da Ericeira
Os olhos são a janela
Duma casa verdadeira
Onde boca é fechadura
Onde cabelo é telhado
Só se entra com ternura
No código organizado
Só se pode querer ficar
Se a palavra «verdade»
Tiver a força do mar
Em noite de tempestade

Duas vezes Anabela
Colina da Ericeira
Os olhos são a janela
Duma casa verdadeira
Onde a voz é o vento
Que faz andar o moinho
No perpétuo movimento
Num circular caminho
A transformar o grão
Na mais macia farinha
Embrulhada com paixão
Na água mais purinha

Duas vezes Anabela
Colina da Ericeira
Os olhos são a janela
Duma casa verdadeira
Os sonhos em argamassa
São matéria de construção
Não os percebe quem passa
Mesmo que dê atenção
Mesmo que vá à procura
De conseguir perceber
A casa toma a figura
E o perfil duma mulher


Segunda Balada para Anabela

Anabela olha o Mundo
À procura da sua paz
A água fica no fundo
A terra surge por trás
Uma mulher debruçada
Na varanda da neblina
Parece não dar por nada
Quando a tarde declina
E na verdade está presa
À vida por decifrar
Olhando a Natureza
A ouvir a voz do mar
Anabela debruçada
Nesta torre de vigia
Fica a vista nublada
Numa tarde muito fria
Tempestade de Verão
Chuva mais inesperada
O calendário diz não
Esta vida está cansada
No meio da monotonia
A água veio de surpresa
Com humidade e alegria
Trazidas pela Natureza
Anabela olha o Mundo
À procura da sua paz
Procura em cada segundo
Sentir o que o tempo faz
O desgaste e a erosão
Dos dias quotidianos
Onde a voz da profissão
Vai trazendo desenganos
Onde a nova guerra-fria
Se fixou na sala de aula
Fica de fora a alegria
Só a tristeza se instala
Anabela debruçada
Nesta torre de vigia
Entre rochas e estrada
Procura uma litania
Procura uma esperança
Desenhada e definida
Um rio que não se cansa
Entre as margens da vida
Sempre pronto a empurrar
As águas mais indecisas
Para o caminho do mar
Onde elas são precisas

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