As velas da memória
Há nos silvos que as manhãs me trazem
chaminés que se desmoronam:
são a infância e a praia os sonhos de partida
Abrir esse portão junto ao vento que a vida
aquém ou além desta me abre?
Em que outro mundo ouvi o rouxinol
tão leve que o voo lhe aumentava as asas?
Onde adiava ele a morte contra os dias
essa primeira morte?
Vinham núpcias sem conto na inconcebível voz
Que plenitude aquela: cantar
como quem não tivesse nenhum pensamento.
Quem me deixou de novo aqui sentado à sombra
deste mês de junho? Como te chamas tu
que me enfunas as velas da memória ventilando: «aquela vez...»?
Quando aonde foi em que país?
Que vento faz quebrar nas costas destes dias
as ondas de uma antiga música que ouvida
obriga a recuar a noite prometida
em círculos quebrados para além das dunas
fazendo regressar rebanhos de alegrias
abrindo em plena tarde um espaço ao amor?
Que morte vem matar a lábil curva da dor?
Que dor me faz doer de não ter mais que morrer?
E ouve-se o silêncio descer pelas vertentes da tarde
chegar à boca da noite e responder
Ruy Belo
Aquele Grande Rio Eufrates
(no dia do 75º aniversário)
Há nos silvos que as manhãs me trazem
chaminés que se desmoronam:
são a infância e a praia os sonhos de partida
Abrir esse portão junto ao vento que a vida
aquém ou além desta me abre?
Em que outro mundo ouvi o rouxinol
tão leve que o voo lhe aumentava as asas?
Onde adiava ele a morte contra os dias
essa primeira morte?
Vinham núpcias sem conto na inconcebível voz
Que plenitude aquela: cantar
como quem não tivesse nenhum pensamento.
Quem me deixou de novo aqui sentado à sombra
deste mês de junho? Como te chamas tu
que me enfunas as velas da memória ventilando: «aquela vez...»?
Quando aonde foi em que país?
Que vento faz quebrar nas costas destes dias
as ondas de uma antiga música que ouvida
obriga a recuar a noite prometida
em círculos quebrados para além das dunas
fazendo regressar rebanhos de alegrias
abrindo em plena tarde um espaço ao amor?
Que morte vem matar a lábil curva da dor?
Que dor me faz doer de não ter mais que morrer?
E ouve-se o silêncio descer pelas vertentes da tarde
chegar à boca da noite e responder
Ruy Belo
Aquele Grande Rio Eufrates
(no dia do 75º aniversário)
7 comentários:
LEMBRO DE UM ENSAIO QUE VI NA INIMIGO RUMOR SOBRE RUY BELO. AINDA AQUI NO BRASIL ELE NÃO É CONHECIDO COMO DEVERIA.
é um grande poeta, amigo afonso, dos maiores da nossa língua!
é um grande poeta, amigo afonso, dos maiores da nossa língua!
Um Poeta com letras maiusculas.
Excelente!
Para Afonso: vai sair na Agulha de em breve um ensaio sobre Ruy Belo da autoria de um novo colaborador. Assim se o fará, como merece, mais conhecido no Brasil. And counting, outras coisas aparecerão.
Fl.M.
mir... "Um Poeta com letras maiusculas." é capaz de ser a última coisa q Ruy Belo gostasse de ver escrito sobre si. Ele q disse q nenhuma palavra deve levantar o pescoço no verso.
Boa ironia... As primeiras versões dos poemas dele têm no entanto maiúsculas e, além disso, nunca escreveu o nome sem elas, como o nosso contemporâneo valter.
um abraço!
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