José do Carmo Francisco
(in Aspirina B)

O regicídio visto por Pascoaes

Descobri no Alfarrabista Bocage na Calçada do Combro a cópia de uma carta de Pascoaes a Unamuno de 2-10-1908. Depois de saudar o «querido amigo», Pascoaes afirma:
«A tragédia de Lisboa foi o desenlace duma luta travada entre o gato e o rato. E, coisa curiosa, o rato matou o gato! João Franco subiu ao poder para eliminar abusos, roubos, sinecuras. O advento do Franquismo representou um tardio arrependimento do Rei Carlos. Calcule a guerra feroz que lhe moveram os partidos (progressista e regenerador) que se viram despojados do Tesouro Público! Guerra de difamação contra o Rei e de ódio contra o Franco. Este viu-se obrigado a recorrer a meios violentos e pouco simpáticos nos tempos de hoje para resistir à onda que o tentava derrubar. Estas medidas violentas exasperaram dois pobres e ingénuos sonhadores (Costa e Buíça) que, num ímpeto que eles julgaram libertador, deitaram a terra D. Carlos e o Príncipe Luís, um adorável rapaz de 20 anos! Resultado: o Franco foi para o estrangeiro por onde anda errante como um fantasma; o Buíça foi para a sepultura, fulminado como um Titã que quis roubar o fogo do céu! No dia 1 de Fevereiro de 1908 havia dois homens em Portugal, João Franco e Buíça; inimigos irredutíveis que se destruíram um ao outro, em vez de salvarem a sua Pátria! Neste momento Portugal é um mistério. É impossível a gente calcular o que virá a ser dele! É uma Pátria que a noite envolve, entregue aos morcegos e às aves agoireiras. Aqui, não se vê um palmo adiante do nariz; é tudo confusão e sombra. Um abraço do seu grande admirador e amigo certo – Teixeira de Pascoaes
Um documento curioso, descoberto e lido cem anos depois, num alfarrabista da Calçada do Combro.

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