Aurélio Porto
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O preço da beleza, nestas ruínas amorosamente
reerguidas, é sem preço. O calcário em pedra solta
e firmes angulares, a talha rasando rente
e os volumes que como harmónio em volta
um só concerto tangem. E a rocha em frente
à pedra impõem a pequenez, enorme nessa rota
que faz a baía tecer de azul fremente
o belo impoluto na mais pura nota.
Até os pássaros no vinhedo prestam o tributo
debicando os bagos, e o majestoso pinheiro
no silêncio ergue seu hino. Lazareto outrora,
hoje este canto do passado ao presente faz o luto,
a ele trazendo a exacta medida do dinheiro,
do que vale e não vale, e do que vale a Hora.
Hotel Lazareto, Castro de Monemvassiá, 16.05.05
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Defronte a mim Ítaca. Mas era esta? Ou outra? Ou
Quefalónia? Ou quê? Mas é pátria, a pátria sempre
buscada, nunca encontrada. O retorno impossível, anos
a fio. E, de súbito, ei-la. E não é ela. Que pátria temos?
O mundo, a terra? Estamos no mundo até ao pescoço,
unha com carne nós e o mundo. E porém não somos
deste mundo. Inacessível pátria, não ta dão gritos,
bandeiras, cores, aplausos. Outros que a ordenhem
assim. Dela recordas a face agora oculta, a terra que
amaste, a que se retirou. Quem dela regressará?
Antisamos, Quefalónia, 22.05.05
Tróia, Setúbal, 13.07.06
(in O Sopro A Mãe A Grécia - 22 sonetos e dois prosopoemas, que integra a colectânea da poesia inédita do autor intitulada Flor de um Dia, ela também inédita)
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