O QUE FAZ CORRER CAVACO OU
UM SIMULACRO DE HOLLYWOOD

Eça de Queiroz, esse excelente prosador, criador de tipos e eminente provinciano como estabeleceu Agostinho da Silva, dizia que Portugal era uma nação traduzida do francês. Talvez…
Actualmente, por obra e graça de boas-vontades e da natural evolução das coisas do mundo, tenho para mim que é um país transcrito de Hollywood – resalvadas as naturais excepções.
Cavaco e Silva, que nos tempos das vacas-gordas conseguiu duas maiorias absolutas muito por mérito do ambiente de arrivismo esperançoso em que então se vegetava por obra e graça dos cheques a fundo perdido de Bruxelas, viveu sempre politicamente criando à sua volta um tom de fita de mistério da série B: não dispondo da aura misteriosa de um Salazar – que mal ou bem acreditava no seu destino de homem providencial – buscou sempre instaurar em torno um ar de segredo a que temos direito, parafraseando um antigo jornal que, como ele, afixava um autoritarismo para novos ricos ideológicos, ainda que de sinal contrário.
Cavaco não é um Roosevelt de centro nem sequer um Kennedy de direita, embora se esforce por parecer um Reagan já não de filme, como o antigo cowboy, mas um ícone realista das economias e dos números para lusitano embobar.
Aquando da sua antiga saída, em que enovelado em sofismas e apuros de contrasenso passou a pasta a um atónito Fernando Nogueira que muito justamente durou o que duram as rosas de Malherbe, Cavaco declarou que se ia embora, para além do mais, porque e cito de memória - sua esposa em geral e a família em particular se queixavam de que lhes dava pouco arrimo.
Declaração magnífica e esclarecedora do perfil dum homem que se pretendeu e pelos vistos pretende, estadista.
Cavaco deve ter feito suas contas. Acreditando-se escudeiro da Pátria, baseado nos tais números em que o dizem perito, com as certezas que o caracterizam e o élan que o deve mover interior e exteriormente, vai ser o novo presidente da República – não sendo de esperar que esse lugar de vilegiatura seja apanhado por um Soares a caminho da senilidade ou um Alegre a caminho da sedimentação lírica.
Só que Cavaco, sendo conforme dizem os entendidos um economista de valor, foi sempre enquanto homo politicus um indivíduo de pouco sustento: em tudo o que se meteu falhou – a estrutura económica ficou frágil, o seu “pensamento” é inexistente, os seus discípulos um almoço ao sol.
Sendo claramente para os sectores dominantes (um Belmiro, um Balsemão, etc. que são quem verdadeiramente manda em Portugal) o senhor que vai meter a caminho cá o jardim florido, limpando-lhes a coutada – vão sair-lhe a terreiro monstros indizíveis. Com o riso de um simpático Jerónimo e de um gárrulo Louçã, que tudo terão a ganhar com a subida à cadeira curul do taciturno algarvio.
Vêm aí tempos pouco entusiasmantes…

Texto de Nicolau Saião / Ilustração de Hélio Rola

5 comentários:

Ruy Ventura disse...

Pois é... Mas, apesar da sedimentação lírica (que já há muito se verifica), apoiarei até ao fim o Manuel Alegre. A esperança é a última a morrer...
Concordo no entanto que tempos ruins se avizinham. Não nos esqueçamos que o homem de Boliqueime foi o responsável pela situação económica em que nos encontramos (como bem revelou Miguel Cadilhe) e o principal instigador do consumismo desenfreado de que padecemos hoje as consequências. Soares, por sua vez, foi o principal defensor da "superioridade moral da democracia portuguesa" que deixou sem castigo os próceres do regime salazarista e fez com que a instituição judicial nunca se reformasse... Deu no que deu... Alegre não deixou de abraçar Soares, mas hoje em dia é o único que pode dar esperança aos portugueses.

Anónimo disse...

Concordo...
Por isso é que no meu texto se nota aquele tom de amargura temerosa.
Soares não interessa, é a cabeça do "soarismo" e está tudo dito.
Cavaco aqui ficou exposto.
E receio que Alegre, infelizmente para nós, não chegue lá.
Gostaria de me enganar!
Para que não venham de novo aí as cargas policiais e as perseguições pessoais aos opositores - e agora ainda por cima existe um sistema judicial no mais baixo da escala e sedento de "respeitabilidade", o que Cavaco não deixará de explorar. Leia-se - os que o conduzirão como um títere, que é para isso que vai servir.
Português sofre...

Anónimo disse...

Aqui eixo esta achega de José de Portugal publicada no "Portugal Diário":
"Lembrem-se que Cavaco foi o que estimulou no povo o consumismo, fiado no cofre de Bruxelas que agora estamos a pagar.
Foi o que mandou a polícia de choque espancar as pessoas.
Foi o que perseguiu gente que não se curvava, e não eram os comunistas.
Foi o que fez obras de fachada.
Foi o que deixou uma economia fragilizada.
Foi o que se rodeou de propagandistas lacaios como o Graça Moura.
Foi o que, depois quando os portugueses abriram os olhos, se foi embora deixando a malta a arder.
Não se deixem enganar.
Por detrás dele, que pode nem ser má pessoa, estão os que nos querem tramar e ainda por cima nos batem.
Ao menos os outros não nos espancam.
Tenham memória!".

Anónimo disse...

luís qualquer dia comes no nariz, quem te avisa e os outros o mesmo

Anónimo disse...

Não sei se é ironia ou asserção este comentário anónimo. Se corresponder à verdade, nada me admira. Algum cavacal apoiante... O "homem" até pode ser sério, mas quem o acompanha já anda a esfregar as mão... Até lavar dos cestos ainda é vindimas.