milagre


a água faz crescer a luz e a distância.
a tempestade devolve, sem chumbo,
esse sangue que o movimento acrescenta
ao coração – da montanha.

ao alcance da mão, a cidade circula
(mesmo nos dias mais frios)
quando a chuva invade esta casa,
revestindo esses seios de sombra e de calor.

não existe cidade. apenas desejo –
outra cidade, sem fogo, sem sangue,
com sangue e fogo nesses olhos sem sono.

a terra arde. a poeira acompanha essa linha.
o calor devolve, sem chumbo, essa seiva
que nunca quisemos perder.

o comboio circula dentro de nós. luz e distância
apagam o incêndio que devorou o coração.

a água dissolve a sede e a cidade.
outra cidade cresce – sem casas, sem frio –
guardando na memória o sal e o tempo
que hoje bebemos, sem filosofia.

(para Emir Kusturika)


PS - Há muito que não punha por aqui um poema meu. Aqui fica com votos de bom fim-de-semana. Até segunda!

1 comentário:

dama disse...

Obrigada, pela sede e pelas linhas.