QUEM NÃO TEM PADRINHOS MORRE MOURO

Sempre me chocou este provérbio, nascido talvez nos tempos da Inquisição e das conversões forçadas, dado que encarna o espírito (nacional?!) da corrupção, do tráfico de influências, da ausência de valorização do mérito. Veio-me de novo à memória no dia em que escrevo, depois de ter lido uma entrada saborosa do poeta-editor Jorge Reis-Sá no seu Diário (18/5/2006). Nela repescou um texto de Manuel Alberto Valente, editor da ASA, intitulado "10 Conselhos (Irónicos) a um Candidato a Jovem Escritor" que, a dado passo, afirma:
- "Procure, se possível, um 'notável'. Se o seu original vier 'recomendado' é evidente que as hipóteses aumentam."
Não me surpreendeu este conselho, pois há muito não tenho ilusões em relação ao meio literário e editorial. Surpreendeu-me neste texto de 2003 a sinceridade do editor que, sem hipocrisia, não hesitou revelar o tráfico de influências que domina o meio em que trabalha. Não estamos habituados a tanta frontalidade no nosso país. Tudo se faz pela calada...
Manuel Alberto Valente tem o condão de revelar o jogo: quem quiser publicar numa editora comercial tem que arranjar cunhas; caso não o faça, as coisas estarão difíceis para o seu lado. Quem não tiver padrinhos morrerá mouro ou investirá dinheirinho do seu bolso em edições de autor ou pseudo-comerciais.
Fernando Pessoa tinha razão: para editar livros, salvo honrosas excepções, só há dois caminhos - gastar dinheiro que eventualmente se tenha ou usar as artes do senhor Manuel Peres Vigário.

PS - M. A. Valente aconselha os candidados a jovens escritores. Seria bom que os seus conselhos se aplicassem apenas à malta nova. Infelizmente as vítimas do tráfico de influências literário encontram-se em todos os níveis etários.

6 comentários:

Vitor_Vicente disse...

Ruy,
eu também li o post do Reis-Sá e resolvi comentar, um a um, os conselhos do Manuel Valente.
Sobre os baptismos em literatura, respondi:
(Nem mais. Conhecer o Dr. Cunha é meio caminho andado. Outro meio é dar o cu ou a cona, ou ambos. Se esse cu e cona também for recomendado pelo Dr.Cunha, está no papo!)»

Ruy Ventura disse...

Bem visto!

Anónimo disse...

Têm os dois razão. Mas esqueceram-se que alguns editores são muito delicados e preferem um belo bobó.
Aqui fica a sugestão, para algum/a escritor/a pouco conhecedor/a das artes editoriais ir prevenido/a.
Um detalhe que me passava: também há casos em que se vai ao cu ao editor.

Anónimo disse...

Ou à editora é claro.

Teresa Lobato disse...

Quem fala assim, Vítor, não é gago, como se diz onde eu nasci!
Obrigada, Ruy, pela divulgação do tema.
Abraço

Anónimo disse...

É a primeira vez que "comento" por estes lados...
é uma pena o Dr. Cunha continuar um fulano tão importante em pleno século XXI.
O senhor Valente sabe bem em que águas navega, só me falta saber quais as suas preferências sexuais. Mas como não estou interessado, não me agradam muito "presas sexuais carecas".
Um pouco mais a sério. è uma vergonha o que se passa, tanto na literatura como na música ou nas artes plásticas.