Antologia “Fanal”
Poetas Novos de Portugal
JOANA NEVES
dois poemas
Por vezes arrastamos a nossa sombra;
Por vezes trazêmo-la:
E num instante podemos segurá-la, ao meio-dia, em Greenwich.
Mas no instante a sombra desaparece;
Oculta-nos tanto quanto a ocultamos a ela.
Qual de nós é o negativo, e o outro a fotografia?
A sombra pode ser um auto-retrato escurecido pela poeira do chão.
Ou o tracejado constante da nossa bonita figura.
Ou então a primeira revelação.
*
“As palavras e as coisas”
Mais exactamente
E os actos e os silêncios e as ausências e os suspiros
E os movimentos e os tempos e as cadências e os sons
No mesmo filme.
No ecrã chato e uniforme, a singularidade é o único nivelamento.
Alguém chorou.
O seu choro disse o que as palavras não dizem.
Há um outro lugar para as palavras.
A frase não relata o facto, ela é o facto.
(nº 9, 26/01/2001)
JOANA NEVES, nascida em Lisboa, é licenciada e mestre em Filosofia pela Universidade de Nanterre (França). Crítica de arte, tem textos dispersos por catálogos de exposições e publicações periódicas, como por exemplo o suplemento Mil Folhas do Público.
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