JOSÉ DO CARMO FRANCISCO
Uma geografia de afectos
Há quem diga que em Portugal não há desporto mas sim clubismo. As pessoas vivem para o seu clube, vivem com o seu clube, vivem, muitas vezes, no seu clube desde a manhã até à tarde. É no clube que tomam o café matinal e ao longo do dia vão comentando arbitragens, treinadores, estratégias e jogadores. Esta ideia de amar o desporto como espaço de privilégio para o homem se defrontar com os seus limites, ultrapassando-se nos sucessivos recordes que vai batendo, não colhe num país onde tudo se faz debaixo do calor da paixão. Pela mesma razão nos Estados Unidos da América nunca será popular o nosso futebol porque admite a hipótese de haver um empate. Ora para eles tem que haver sempre um vencedor e um vencido. Tem que haver sempre alguém que esmaga alguém. Por isso o nosso futebol não será nunca popular por aquelas paragens.
Voltando à ideia do clubismo eu tenho a ideia de que é mesmo o clubismo que ainda aguenta este frágil edifício do desporto em Portugal. Por exemplo esta semana o Sporting Clube de Portugal foi brutalmente prejudicado pela arbitragem que não viu um golo marcado com a mão nem as grandes penalidades cometidas sobre João Moutinho e sobre Liedson. Pois a minha resposta foi simples. Não barafustei, não gritei, não acusei – nem era preciso porque as imagens das televisões são muito explícitas. Então fui à secretaria inscrever o meu neto que ainda não tem dois meses. Ele é agora o sócio nº 87.588. Mais um para sentir esta geografia de afectos que vive e que luta como um leão desde 1906. Ele passa o tempo a descansar do difícil trabalho de nascer mas já faz parte desta multidão de verde e branco. Desta geografia de afectos.
5 comentários:
Este desportista é tão sectário do Sporting como é da política.
E vem falar-nos em clubismo, é preciso lata.
Este desportista é um homem que tem capacidade de reflectir e por isso entender, o que se passa à sua volta. Sendo que este texto, aparentemente singelo, revela a nobreza do seu carácter que está na capacidade de amar, revelada nas mais pequenas coisas. Por isso é poeta e talvez por isso, há quem não entenda
A Geografia de Afectos dos clubes é muitas vezes uma faca com dois gumes, já que faz com que tenhamos problemas de "daltonismo", e possamos vir a sofrer de "clubite aguda", a doença que mais mal tem feito ao futebol, e que poderá levá-lo para uma rua com poucas saídas. A batota, cada vez mais evidente, do nosso futebol (corrupção, doping, compadrio, etc) é o melhor exemplo da prática desta "clubite aguda".
Este título do Zé do Carmo Francisco é muito sugestivo. Fez com que me recordasse do meu clube de bairro, onde fiz atletismo e onde senti esta "Geografia de Afectos" com toda a sua plenitude. Isso aconteceu porque faziam parte deste clube muitos dos meus amigos, e sobretudo, por funcionar como uma verdadeira família desportiva. Conheci outros clubes, mas esta "Geografia de Afectos", nunca mais surgiu, pelo menos de uma forma tão intensa.
Há quem se recuse a baptizar os filhos com poucos meses por achar que é impor-lhe algo com que eles poderão, mais tarde, não concordar.
Esta coisa de inscrever crianças como sócios e injectar-lhes, desde muito cedo, a mesma clubite doentia dos seus familiares é, no mínimo, estranha.
O sportinguismo deste senhor só pode ser levado a sorrir...
Ou a chorar,sou benfiquista e lia este sportinguista com algum gosto, mas, percebi que era um sectário e perdi a vontade de o ler, pois anda sempre com água no bico, é pena.
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