Vozes do Brasil
RIBEIRO COUTO
Estrela-do-Mar em Sesimbra
Morta na areia, dura estrela fria,
Que abandonada luz em ti viveu?
Estrela, sim, mas quem te chamaria
Estrela, se à mercê da mão como eu
Sentisse a tua condição sombria?
De que noite abismal, de que remota
Paragem ao molusco o céu chegou,
Qual o seu nascimento e a sua rota,
Se do fundo do mar se afeiçoou
Ao que anda além da superfície ignota?
Caída, não. Não vem de estrela alguma
Esta que nos oceanos já dormiu
E amortalhou-se com areia e espuma.
Da terra vem. Do chão do mar surgiu
E ainda é mar que da concha lhe ressuma.
Quebrá-la agora bem que eu poderia.
Mas para quê? Nada compreenderei.
Nada compreenderei, estrela fria,
Senão que morta estás e que não sei
Se duraste um milénio ou só um dia.
(in Entre Mar e Rio, 1952)
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