De novo o medo

Vive-se neste momento em Portugal, tal como em certas alturas do chamado PREC, de novo um clima de sedição. Claro, insofismável, digamos que proposto com todo o descaramento por asseclas do poder que só está tranquilo quando manda discricionariamente e quando estabelece a apreensão na cabeça do Zé Povinho.
Certas entidades já nem mesmo disfarçam os seus intuitos visando desestabilizar o regime e criar as condições propícias a um golpe de Estado institucional, ou seja: não feito através das armas e do envio para a prisão dos adeptos do “establishment” – a Europa talvez não estivesse pelos ajustes – mas mediante o método mais soft, mas infinitamente mais cínico e perverso, da aquisição de “uma maioria, um governo, um presidente” como referia o slogan muito glosado dos nostálgicos do direitismo mais alvar e servir-se disso, depois, para o conhecido “quero, posso e mando”.
Em determinadas localidades, já nem mesmo se tapam, como sói dizer-se: declaram com santa ingenuidade que o seu alvo é, através dos bons ofícios do putativo próximo presidente da República, colocar no redil da marginalização pessoas que não os apoiem nem os sufraguem, numa atitude claramente anti-democrática que se espelha na jaculatória propagandística do algarvio de Boliqueime, que declarou com toda a desfaçatez que não falaria, não dialogaria, não debateria a não ser segundo as suas regras de candidato a autocrata para, pasme-se, dar dignidade à campanha. Ou seja: infere-se que a maior dignidade seria conseguida se não houvesse debates de todo em todo, como nos bons tempos do doutor Salazar. Percebe-se perfeitamente que para certos fulanos a democracia de partidos é um estorvo e a democracia “tout court” uma espécie de azia que sairá com os sais de frutos de uma presidência musculada e desejavelmente anti-constitucional.
Em certos lugares, como na cidade onde moro, a receita é simples: marginalizam-se os dissidentes (nos diversos campos onde actuem, culturais, educacionais…) – muitas vezes deixando que siga curso a difamação e a calúnia – cala-se-lhes a boca através da discriminação e das veladas ameaças. Mais tarde e quando já tiverem tudo nas mãos impolutas seguir-se-ão, se necessário, outras acções mais decididas e viris. E, se tal se mostrar preciso, far-se-á o que for de fazer para meter juízo nas cabeças “implumes” dessa gente. Não é para isso que servem os sistemas jurídicos desqualificados, as forças militarizadas sem ética e os esbirros declarados?
Não pensem os ingénuos que por vivermos na “civilizada Europa” estamos defendidos destas coisas sibilinas e inquietantes: basta olhar-se para a Itália e meditar-se no que Berlusconni tem feito à pátria de Miguel Ângelo. Só no Terceiro Mundo é que estas coisas acontecem? Ora, ora…
Há sectores que jogam na consabida falta de memória das populações, no seu desejo de facturar mesmo que a produção escassa não o aconselhe, no egoísmo dos que, depois de delapidarem as gordas esmolas de Bruxelas, querem também delapidar os poucos cobres que se salvaram da voragem consumista posta a correr precisamente pelo grande economista que agora se apresenta como salvador da pátria.
Para falarmos claro: esses sectores que só esperam um decisivo passo em falso do pouco excitante primeiro-ministro actual para, num passe de mágica, nos saltarem à garganta, como nos filmes do Stephen King…

Post scriptum – Horas depois de escrito este artigo, Cavaco e Silva foi entrevistado pela TVI no âmbito da roda de sessões com os candidatos levada a efeito por aquela estação emissora.
Confrontado apenas com uma Constança Cunha e Sá até um pouco veneradora, Cavaco não se aguentou, ficando reduzido àquilo que verdadeiramente é em igualdade de terrenos: um intelecto vulgar, metendo os pés pelas mãos e preso de contradições que o seu espírito não consegue, realmente, deslindar.
Por esta amostra se percebe a estratégia de procurar ficar calado o maior período de tempo possível, assumindo o ar hierático de estadista genial. É a sua melhor defesa e a mais eficaz imagem de marca de quem nada de verdadeiramente fundamental tem para comunicar. Quando se defrontar com uma velha raposa da política e dos debates a sério, como Mário Soares, deve ser giro o estenderete…
Nicolau Saião / ilustração de Enrique Lechuga

16 comentários:

Ruy Ventura disse...

Nicolau não pôs aquilo que se sabe, que a sua cidade (e minha) de que fala é Portalegre.

Ruy Ventura disse...

Cavaco aposta exactamente na falta de memória dos portugueses ou, melhor dizendo, numa memória distorcida dos nossos compatriotas. Deseja, nomeadamente, que esqueçamos que as suas bem amadas vacas gordas engordadas não com a sua competência mas com farinhas da CEE são a causa da magreza em que as vaquinhas actuais andam mergulhadas. Deslumbrado, incutiu nos portugueses a sensação de que tudo poderiam ter independentemente de termos dinheiro ou não. Deu no que se viu.
Mas a questão que Nicolau Saião levanta é ainda mais importante. O perigo de Cavaco não é Cavaco, mas quem o rodeia, que espera aproveitar a oportunidade da sua eleição para se atirar aos seus semelhantes como gato a bofes, sobretudo àqueles semelhantes que tiverem uma opinião contrária.

Anónimo disse...

A por ellos, Nicolao!

Anónimo disse...

ó saião bufo do sis quem não te conhecer que te compre.

Anónimo disse...

Este Assentos é mas é esparôva. Deves de ser um rico pêéssedê,mas dos que andam na cola do Matocas.

Ruy Ventura disse...

O comentário do Assentos é Portalegre no seu melhor... Obrigado!

Anónimo disse...

A questão é esta: há gente que não se enxerga.
Uma coisa é o comentário de cadeira de barbeiro (ainda quente do rabo aneterior), de tasca com copo de três nas unhas (em geral com sarro), de esquina de praça (debaixo da laranjeira), de cabaret rasca de vilória de província (ao som de música rasca e desfinada).
Outra, é vir para um espaço de cultura e de liberdade, fazer conversa desqualificada. A Estrada, que venho acompanhando desde o início com curiosidade e muito interesse, não é barbearia, não é tasca, nem esquina, nem cabaret. Aliás, o próprio nome diz que é "estrada". Ora, numa estrada, a não ser que apareça um estúpido buraco de quando em vez, é sítio de rolar, linha de prosseguir, horizonte de procura, mar de sabedoria a desfiar. E a seguir à estrada, há sempre algo mais.
A seguir ao veneno, só há o antídoto: uma boa gargalhada...
Polémica, adeus que se faz tarde.
Oh yes...

Anónimo disse...

Peço desculpa pelo "aneterior" que era "anterior" e pelo "desfinada" que é "desafinada".
Escritos feitos de impulso podem dar uma ou duas gralhas como estas.

Anónimo disse...

E ainda outra coisa:
É que Portalegre não é o centro do Mundo. O centro do Mundo está no pensamento. Se o pensamento é fraco, há um deslizar do globo e o eixo terrestre sofre ligeiro enviezamento. Se o pensamento é forte, o Mundo mantém-se no eixo e gira na perfeição. É uma lei da Física que já vem do Cro-Magnon...

Anónimo disse...

Visitei agora o blog e vi os comentários sensatos e fraternais de confrades em desforço ao comentário de um senhor pelos vistos portalegrense (Portalegre no seu melhor como bem disse o Ruy). Gente assim já conhecemos como se "ispilica", como dizia o Badaró - e isto porque vivemos nessa urbe.
Um exemplo, para conferir: há aqui um fulano - outros lhe têm chamado um burlão, um vigarista, um disfuncional evidente, que durante 20 anos andou a auto-apelidar-se de doutor, vindo fotografado e publicado nos jornais (num deles chegou a sub-director!), ao pé do bispo, das entidades gradas locais, falando grosso e lampeiro...
Pois a certa altura foi desmascarado: não tinha nenhuma licenciatura, enganara toda aquela gente - bispo incluído - enfeitando-se com penas de pavão e sem nehum rebuço.
Teve de sair do jornal onde se pavoneava, inclusivamente servindo-se desse estatuto para perseguir gente que lhe caía sob a mira.
Pois apesar disso, certa gente de Portalegre continuou a chamar-lhe doutor! No próprio areópago cultural onde as coisas sucedem, apesar de alertada a pessoa que lá decide convidou-o como doutor para apresentar uma sessão...
Ao ser prevenida disse com candura que não queria tomar posição numa coisa com que nada tinha a ver(!!!).
Ou seja: continuar a exalçar um burlão (como foi taxado) é um acto de tolerância...portalegrense.
É pena que essa consideração não tenha como alvo outras pessoas, essas sim dignas e com obra feita e saliente!
Por isso, não nos admiremos que na cidade haja gente como aquela que aqui escarrou.
Um abraço aos amigos e às pessoas sérias, sejam ou não lagóias, nomeadamente leitores.

Ruy Ventura disse...

As atitudes de certa gente, mui parecidas com a de certos bêbados tabernais ou com a de conhecidos arruaceiros cuja civilização está ao nível da civilização macacal (perdoai-me macacos, pois sois infinitamente superiores), só dão mesmo para rir. Os cães ladram e a caravana passa na nossa Estrada... Para a frente é que é o caminho.

Anónimo disse...

Uma coisa boa o assento(escolheu bem o apelido)conseguiu: umas "respostadas" do melhor. Se calhar não deveria, mas "delirei" com as vossas respostas.

Anónimo disse...

Caríssima Castanha, só um esclarecimento: Assentos é um dos bairros de Portalegre, onde vivem pessoas de médio poder financeiro e outros nem tanto... faço-me entender? Deve ter sido para disfarçar que o energúmeno em causa escolheu aquele pseudónimo - porque um dedinho que eu tenho me diz que deve ser tipo de teres e haveres...É por esse tipo de gente que eu costumo (e o Ruy e todos que naquela terra levantem cabeça para desmascarar malandrins) ser atacado.
Fez muito bem em ter desmecado com os comentários, liberdade e cultura tb são alegria!
Já agora, mais uma engraçada: por altura da campanha de difamação a que o Ruy, eu e o João Garção fômos sujeitos por, com mais 12 publicistas, termos desmascarado uns "donos da cultura local"(todos condenados na Relação de Évora), o poeta Carlos Garcia de Castro, que era nossa testemunha, foi de tal modo perseguido com telefonemas anónimos que teve de mudar de número. Quando por acaso falei nisso a um responsável local (não cito o nome e o cargo por piedade) ele respondeu-me:"Ah!, isso deve ter sido gente que gosta de brincar!". E dizia-o a sério eheh!
E esta, hein? como diria o Fernando Pessa...

Anónimo disse...

Obrigada pelo esclarecimento ingénuamente associei "assentos" a uma pessoa acomodada que se afunda em inveja pelos que se sabem "mexer"
Não fazia ideia de que as coisas tivessem sido tão sérias.
Fico contente porque não se terem detido apesar, das cobardias e hipocrisias locais.
Sempre atenta aos Guerreiros,
um abraço,
Cláudia

Anónimo disse...

É isso, Cláudia. Sigamos em frente sem nos estorvarmos com malandrins - mas mantendo sempre os flancos da caravana vigiados, como nos filmes do Gary Cooper eheh.
Há gente que só sabe espingardear pela calada, uma vez desmascarados afundam-se. Para finalizar estas revelações tristes, outra estória (real) talvez com piada (pelo menos acho que é instrutiva). Sabe qual foi a primeira pergunta que, consentida pela pessoa que presidia ao...julgamento, o advogado dos réus fez ao João Garção quando este depôs? Foi esta: "Uma pergunta para começar: o senhor é anarquista?". Ao que o João respondeu calmamente: "Não, sou autarca, deputado numa Assembleia Municipal. E como se verifica também não sou preto...". Eheh!
O homem embatucou. Mas a pessoa que presidia nada disse, ficou com um sorriso alvar - ela que tudo parece ter feito para... "safar" um dos réus.
Mas como ainda há magistrados competentes em Portugal, não foi o suficiente.

Anónimo disse...

O que contou é tão absurdo e ridículo, que realmente só contando para espevitar alguma gargalhada.